sábado, 1 de dezembro de 2012

ODE MARÍTIMA - Auditório Camões

 
 
 
 
 
 
 
 
 
Incontornável, Fernando Pessoa, assinou com o heterónimo Álvaro de Campos, a Ode Marítima, um retrato de uma viagem que se inicia no cais e se prolonga e aprofunda no interior do ser, do sonho, da descoberta do ser em mutação, em revolta. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Encenada por João Rosa que acredita que "o teatro não pode ser só entretenimento, cultura e aprendizagem é sobretudo intervenção, agressão, revolta e combatividade. Deixem-se alertar, acordar e espicaçar pelo teatro!", venha assistir à Ode Marítima no Auditório Camões em Lisboa, até ao dia 2 de dezembro.

Fica um excerto ... deixem-se levar pelo teatro....
 
 
"Sozinho, no cais deserto, a esta manhã de Verão,
Olho pro lado da barra, olho pro Indefinido,
Olho e contenta-me ver,
Pequeno, negro e claro, um paquete entrando.
Vem muito longe, nítido, clássico à sua maneira.
Deixa no ar distante atrás de si a orla vã do seu fumo.
Vem entrando, e a manhã entra com ele, e no rio,
Aqui, acolá, acorda a vida marítima,
Erguem-se velas, avançam rebocadores,
Surgem barcos pequenos de trás dos navios que estão no porto.
Há uma vaga brisa.
Mas a minh'alma está com o que vejo menos,
Com o paquete que entra,
Porque ele está com a Distância, com a Manhã,
Com o sentido marítimo desta Hora,
Com a doçura dolorosa que sobe em mim como uma náusea,
Como um começar a enjoar, mas no espírito.

Olho de longe o paquete, com uma grande independência de alma,
E dentro de mim um volante começa a girar, lentamente,

Os paquetes que entram de manhã na barra
Trazem aos meus olhos consigo
O mistério alegre e triste de quem chega e parte.
Trazem memórias de cais afastados e doutros momentos
Doutro modo da mesma humanidade noutros pontos.
Todo o atracar, todo o largar de navio,
É — sinto-o em mim como o meu sangue -
Inconscientemente simbólico, terrivelmente
Ameaçador de significações metafísicas
Que perturbam em mim quem eu fui..."