No dia 21 de março, sábado, um dia a seguir ao início da Primavera, comemorou-se o Dia Mundial da Poesia e da Árvore.
De uma ampla e diversificada escolha, não faltam excelentes e reconhecidos poetas portugueses, deixo dois poemas: o primeiro do Joaquim Pessoa, como um elogio a saber ser pessoa, o outro, de António Gedeão, pela força da Natureza!
SÃO AS PESSOAS COMO TU
São as pessoas como tu que fazem com que o nada queira dizer-nos algo, as
coisas vulgares se tornem coisas importantes e as preocupações maiores sejam de
facto mais pequenas.
São as pessoas como tu que
dão outra dimensão aos dias, transformando a chuva em delirante orvalho e
fazendo do inverno uma estação de rosas rubras.
As pessoas como tu possuem
não uma, mas todas as vidas. Pessoas que amam e se entregam porque amar é
também partilhar as mãos e o corpo. Pessoas que nos escutam e nos beijam e
sabem transformar o cansaço numa esperança aliciante, tocando-nos o rosto com
dedos de água pura, soltando-nos os cabelos com a leveza do pássaro ou a
firmeza da flecha.
São as pessoas como tu que
nos respiram e nos fazem inspirar com elas o azul que há no dorso das manhãs, e
nos estendem os braços e nos apertam até sentirmos o coração transformar o
peito numa música infinita.
São as pessoas como tu que
não nos pedem nada mas têm sempre tudo para dar, e que fazem de nós nem ícaros
nem prisioneiros, mas homens e mulheres com a estatura da vida, capazes da
beleza e da justiça, do sofrimento e do amor.
São as pessoas como tu que,
interrogando-nos, se interrogam, e encontram a resposta para todas as perguntas
nos nossos olhos e no nosso coração. As pessoas que por toda a parte deixam uma
flor para que ela possa levar beleza e ternura a outras mãos.
Essas pessoas que estão
sempre ao nosso lado para nos ensinar em todos os momentos, ou em qualquer momento,
a não sentir o medo, a reparar num gesto, a escutar um violino.
São as pessoas como tu que
ajudam a transformar o mundo.
Joaquim Pessoa in "Ano
comum"
Fala do Homem Nascido
(Chega à boca da cena, e diz:)
Venho da terra assombrada,
do ventre de minha mãe;
não pretendo roubar nada
nem fazer mal a ninguém.
Só quero o que me é devido
por me trazerem aqui,
que eu nem sequer fui ouvido
no acto de que nasci.
Trago boca para comer
e olhos para desejar.
Com licença, quero passar,
tenho pressa de viver.
Com licença! Com licença!
Que a vida é água a correr.
Venho do fundo do tempo;
não tenho tempo a perder.
Minha barca aparelhada
solta o pano rumo ao norte;
meu desejo é passaporte
para a fronteira fechada.
Não há ventos que não prestem
nem marés que não convenham,
nem forças que me molestem,
correntes que me detenham.
Quero eu e a Natureza,
que a Natureza sou eu,
e as forças da Natureza
nunca ninguém as venceu.
Com licença! Com licença!
Que a barca se fez ao mar.
Não há poder que me vença.
Mesmo morto hei-de passar.
Com licença! Com licença!
Com rumo à estrela polar.
António Gedeão em 'Teatro do Mundo'
Venho da terra assombrada,
do ventre de minha mãe;
não pretendo roubar nada
nem fazer mal a ninguém.
Só quero o que me é devido
por me trazerem aqui,
que eu nem sequer fui ouvido
no acto de que nasci.
Trago boca para comer
e olhos para desejar.
Com licença, quero passar,
tenho pressa de viver.
Com licença! Com licença!
Que a vida é água a correr.
Venho do fundo do tempo;
não tenho tempo a perder.
Minha barca aparelhada
solta o pano rumo ao norte;
meu desejo é passaporte
para a fronteira fechada.
Não há ventos que não prestem
nem marés que não convenham,
nem forças que me molestem,
correntes que me detenham.
Quero eu e a Natureza,
que a Natureza sou eu,
e as forças da Natureza
nunca ninguém as venceu.
Com licença! Com licença!
Que a barca se fez ao mar.
Não há poder que me vença.
Mesmo morto hei-de passar.
Com licença! Com licença!
Com rumo à estrela polar.
António Gedeão em 'Teatro do Mundo'
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